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Gabinetes para o povo?

 Gabinetes para o povo?

O presidente da Câmara Municipal de Barretos, Luís Paulo, o Lupa (REP), assinou no último dia 3 de julho um Termo de Referência para a contratação direta de empresa que construirá gabinetes para os vereadores no prédio do Poder Legislativo. Um Termo de Referência é um documento informativo a respeito do necessário para a contratação de um determinado serviço ou aquisição de produto, via edital licitatório ou de forma direta.

O documento, em sua fundamentação, explana que a estrutura física da Câmara Municipal, de longa data, apresenta carência de gabinetes para que os parlamentares possam, junto a seus assessores, desenvolver o exercício de suas atividades com mais propriedade e dignidade.

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Agora, ponderando que o mandato de vereador é concedido via processo eleitoral pelo povo, podemos afirmar que o gabinete é, na verdade, uma sala do povo? Podemos afirmar que o vereador tem a obrigação moral de receber todos os munícipes que o procurarem, obviamente, respeitando o horário de reunião pré-estabelecido e previamente agendado? Pode até haver um nobre vereador que argumentará que não, que o gabinete é um espaço reservado ao parlamentar para que ele possa focar nos assuntos pertinentes ao município. Mas a verdade é que a moral determina que, pelo fato de o gabinete do vereador pertencer a um espaço institucional dentro da Câmara Municipal e, portanto, ser um ponto de contato direto entre munícipe e parlamentar, o gabinete é, sim, um espaço do povo. Novamente repito: “espaço do povo” nada tem a ver com o pejorativo ditada “casa da mãe Joana”, onde a anarquia impera.

Logo, repito, respeitando o devido horário pré-agendado, os parlamentares terão a obrigação de ter, em suas agendas, espaço para receber os cidadãos em seus respectivos gabinetes, a fim de receber demandas, ouvir sugestões e problemas das comunidades. É, portanto, um espaço do povo e para o povo, mas isso não quer dizer que o munícipe poderá ir à hora que quiser e fazer o que bem entender.

Caberá aos vereadores o devido respeito à população e o ato de receber a “D. Maria” e o “Sr. José” não apenas na primeira semana, quando se tirarão muitas fotos “instagramáveis”, para depois vedarem as portas à população e praticarem políticas fisiológicas. Hoje, as conversas com a população ocorrem em suas casas próprias, nos cafés, bares, ou seja, onde for possível a reunião. Penso, portanto, que a construção dos gabinetes dará, sim, o devido respeito que a liturgia do cargo necessita. Isso se aplica não apenas ao vereador, mas também para que o munícipe seja recebido com equidade.

Chamou-me a atenção que, neste Termo de Referência, o qual já em seu título expressa ser de contratação direta, à primeira vista, poderíamos pensar que isso abre margem para possíveis irregularidades. Contudo, em sua diretriz 5.12.17, define claramente: “Não contratar, durante a vigência do contrato, cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, de dirigente do contratante ou do Fiscal ou Gestor do contrato, nos termos do artigo 48, parágrafo único, da Lei nº 14.133, de 2021”. Isso implica que a empresa que prestar o serviço não poderá contratar ninguém que, durante o processo de trabalho, tenha vínculo direto com o contratante, ou seja, com a Câmara Municipal; subentende-se, alguém ligado aos edis. Achei contraditório, porque, há pouco tempo, os próprios vereadores aprovaram uma Lei em que o Poder Executivo não poderia contratar pessoas, praticamente, da mesma forma para trabalhar. Por que, para o Poder Executivo, pode-se contratar pessoas com vínculo direto, e para prestar serviço na Câmara não se pode?

Sei que muita gente vai pensar que a porta da Câmara ficará cheia de pessoas, querendo que os vereadores paguem contas atrasadas, doem sacos de cimento, liberem cestas básicas; enfim, que a população vai extrapolar seus direitos. O papel do vereador não é para isso. Aliás, isso já acontece quando são abordados na rua, em seus carros, etc. O gabinete pode vir a facilitar essa prática nefasta de achar que político tem de dar o que se quer e não se importar com o bem da cidade como um todo. Repito: o papel de vereador não é para isso. Se algum vereador auxiliar o cidadão com algo do gênero, parabéns pela filantropia dele. Mas, se o vereador pedir voto em troca, é corrupção. E o crime não é apenas de quem compra o voto, mas aquele que o vende também é passível de crime.

Fica a dica: sua dentadura, seu vale-churrasco, ou seja, qualquer tipo de “vantagem” que se pensa conseguir de algum vereador, pode custar caro à cidade nos próximos anos. Minha tranquilidade, contudo, é que sei que os nobres vereadores saberão se desvencilhar desses pequenos percalços. Ao menos até 2028, ano em que muita “onça” correrá livre pela cidade. Aí, meu amigo, salve-se quem puder!

Tulio Guitarrari é filósofo, técnico contábil, jornalista e pós-graduado em Ciências Políticas e Teologia.

Redação

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