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“Abin paralela” elaborou dossiê contra Bispo de Barretos, diz PF

 “Abin paralela” elaborou dossiê contra Bispo de Barretos, diz PF

Relatório da Polícia Federal aponta monitoramento ilegal de líderes religiosos críticos ao governo Bolsonaro; entre os alvos está o bispo de Barretos, Dom Milton Kenan Júnior

A Polícia Federal (PF) revelou que quatro bispos com atuação na região de São José do Rio Preto, incluindo o bispo de Barretos, Dom Milton Kenan Júnior, foram alvo de monitoramento ilegal realizado por uma estrutura informal dentro da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), conhecida como “Abin paralela”, durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

De acordo com reportagem publicada na edição de sábado (21) do Jornal Diário da Região, a investigação da PF aponta que o levantamento de informações teve como base um manifesto público assinado por 152 bispos e arcebispos brasileiros em julho de 2020, no auge da pandemia da Covid-19. O documento, chamado “Carta ao Povo de Deus”, trazia críticas contundentes à condução política, econômica e sanitária do governo federal.

Além de Dom Milton Kenan Júnior, de Barretos, aparecem como alvos da investigação os bispos Demétrio Valentini (emérito) e José Reginaldo Andrietta, de Jales, e Antônio Celso de Queirós (já falecido), de Catanduva.

Como funcionava a “Abin paralela”

O relatório da PF, com 1.125 páginas, foi encaminhado ao Supremo Tribunal Federal (STF) na última quarta-feira (18) e teve o conteúdo divulgado nos últimos dias. Nele, os investigadores afirmam que a elaboração dos dossiês foi ordenada pelo Gabinete de Segurança Institucional (GSI) da Presidência da República, órgão ao qual a Abin era subordinada.

Segundo a PF, o então diretor-adjunto da Abin, Frank Márcio de Oliveira, foi quem repassou a ordem a um agente da Polícia Federal cedido à agência. Ambos estão entre os 35 indiciados na investigação.

Conversas extraídas de aplicativos de mensagens mostram que, no mesmo dia em que a carta dos bispos foi publicada, houve a determinação para fazer um “perfil de cada um” dos religiosos signatários. Em uma das mensagens, um dos agentes escreveu: “Sem pressa. Acho que amanhã está bom”. No dia seguinte, os primeiros relatórios começaram a ser enviados.

Monitoramento foi além da Igreja

Ainda de acordo com o relatório, a chamada “Abin paralela” não teria se limitado a acompanhar líderes religiosos. Também foram alvos do monitoramento deputados federais de oposição, jornalistas, auditores fiscais e influenciadores digitais críticos ao governo Bolsonaro.

Os investigadores afirmam que o esquema clandestino envolveu o uso de recursos humanos e tecnológicos da Abin, incluindo softwares que permitiam a coleta de dados de celulares e a geolocalização de pessoas monitoradas. O relatório menciona ainda que cerca de 1.796 terminais telefônicos foram rastreados.

O objetivo das operações, segundo a PF, era levantar informações que pudessem ser usadas para constranger opositores políticos ou desqualificar manifestações públicas de crítica ao governo.

Posicionamento das dioceses

O arcebispo de São José do Rio Preto, Dom Vilar, informou que aguarda a análise integral do relatório antes de emitir um posicionamento oficial. A manifestação, segundo ele, será feita em conjunto com a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).

O que dizia a carta dos bispos

O manifesto publicado em 2020 alertava para a gravidade do momento vivido pelo Brasil, apontando uma “crise de saúde sem precedentes”, além de um “colapso avassalador da economia” e “tensão sobre os fundamentos da República”, que, segundo os religiosos, seriam agravados pela postura do então presidente da República.

Além dos 152 bispos e arcebispos, cerca de mil padres também assinaram o documento.

Agora, com a divulgação do relatório da PF, o caso entra em uma nova fase de tramitação no Supremo Tribunal Federal, onde poderá haver responsabilização criminal dos envolvidos no esquema de monitoramento ilegal.

Igor Sorente

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