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Morreu a Vale TV. E junto com ela, morreu mais um pedaço da alma de Barretos.


No dia 11 de julho de 2025, caiu o sinal. Primeiro, disseram que era problema técnico. Mas logo veio a verdade escancarada, estampada na capa do jornal O Diário: a CPFL cortou a luz por falta de pagamento. Sim, senhoras e senhores, a nossa única emissora comunitária, nascida como TV Soares Educativa em 1990, morreu porque não conseguiu pagar a conta de luz.
Mas a morte da Vale TV não foi repentina. Foi anunciada, lenta e dolorosa. E mais do que isso: foi ignorada.
Uma história de resistência que virou cinzas — literalmente
Barretos teve o privilégio raro de ser uma das poucas cidades do interior com uma TV própria. Uma televisão que falava de Barretos para Barretos. Que exibia jornal local com o saudoso Luiz Carlos Fabrini. Que produziu teledramaturgia com A Turma do Peãozinho. Que ousou quando ninguém ousava. Ela formou, comunicou, educou e entreteve.
Mas resistir cansa. E quando a política vira as costas, a cultura morre.
Antes mesmo da intervenção do Ministério Público, levaram todas as fitas históricas para o quintal da emissora e colocaram fogo. Isso mesmo: a memória da cidade virando cinzas diante da omissão geral.
Trabalhadores invisíveis, abandonados pelo sistema
E enquanto a emissora se despedaçava, os poucos funcionários que ainda mantinham de pé aquela estrutura sucateada passaram dez anos (ou mais) sem nenhum direito garantido.
Você leu certo: sem INSS recolhido. Sem FGTS. Sem nada. Nem um mísero centavo de proteção trabalhista.
Esses bravos lutadores, que seguiam por amor à comunicação, que mantinham a TV no ar com o suor do rosto e o fio do sinal, hoje não têm o que sacar, não têm aposentadoria garantida, não têm nenhuma rede de proteção.
E o Ministério do Trabalho? Onde estava? Como pode, em pleno século 21, uma emissora de televisão operando por tanto tempo sem qualquer fiscalização trabalhista efetiva? Será que o poder público só aparece para cortar a luz — ou cortar fita em inauguração?
O assassinato fora das telas
Em 2011, o então diretor da TV, Marco Antonio Moreira Lagos, foi brutalmente executado com sete tiros. O motivo? Uma dívida comercial com os antigos donos da emissora. Quatro réus foram condenados por homicídio qualificado.
A história da Vale TV está marcada por lutas, omissões, processos, e mortes — simbólicas e reais.
Sem publicidade estatal, sem vida
Vamos falar claro? No Brasil, quase toda mídia local sobrevive graças à publicidade da prefeitura. Fingir que não é assim é hipocrisia. A Vale TV perdeu o apoio da administração municipal, foi engolida pela falência da escola mantenedora, e caiu num buraco onde nem o Ministério Público conseguiu mais resgatar.
O prefeito comunicador e o silêncio que ele produz
E o mais irônico de tudo isso? O atual prefeito de Barretos, Odair de Moura e Silva, é radialista. É comunicador. Viveu do microfone. Se elegeu dizendo que respeitaria a imprensa.
Mas como já dissemos em outro editorial: Odair acredita que pode governar apenas com mídia amiga e tenta desmoralizar o Legislativo.
Qual será a próxima voz a ser silenciada?
O Sertanejo decidiu ser independente. Mas a Vale TV morreu porque não tinha apoio, nem dinheiro, nem proteção, nem socorro. E o que a matou foi uma soma: da omissão dos poderes, da indiferença política e da covardia silenciosa dos que sabiam — e se calaram.
Se continuar assim, outras vozes serão caladas. E, quando tudo estiver em silêncio, não vai mais ter ninguém para contar a verdade.
