Pixiu foi peão, cozinheiro e baita contador de histórias

 Pixiu foi peão, cozinheiro e baita contador de histórias

Uma via pública no Jardim Anastácio preserva a memória do popular Pixiu. Laudelino Marques de Castro nasceu na fazenda Monte Alegre no dia 14 de outubro de 1921. Casou-se com Leonor Batista de Castro no dia 23 de abril de 1947. O casal teve 10 filhos, netos, bisnetos e tataranetos. A matriarca morreu em 27 de maio de 2010. O chef do “restaurante itinerário” do estradão faleceu no dia 5 de fevereiro de 2012.

Em sua trajetória, Pixiu foi comerciário, funcionário público municipal, administrador de fazenda, peão de boiadeiro e cozinheiro de comitivas. Um dos primeiros moradores da Vila Marilia. Já foi campeão da competição culinária na Festa organizada pela Associação Os Independentes e seu nome consta no Memorial as comitivas pioneiras da Queima do Alho. A homenagem está em obelisco localizado no Ponto de Pouso, no Parque do Peão.

Vencedor da Queima do Alho de 1995, Pixiu, diz que viu, contrariado, seu prêmio rateado entre os integrantes da comitiva. Por isso decidiu encerrar sua participação na prova. Passado o incidente, bem-humorado, gostava de lembrar e contar à nova geração “os bons tempos” em que conduzia boiada de fazenda em fazenda até chegar num frigorífico ou charqueada para o abate.

Pixiu classificava como “folgada” a dura vida no estradão. Acordar pela manhã, fazer café bem forte para a peonada era moleza. Em seguida, arrear o cavalo, colocar o cargueiro no burrão e rumar na frente da boiada era seu compromisso diário. Depois de um tempo de marcha, arranchar, retirar da broaca as panelas, talheres e outros utensílios para preparar o almoço era uma das suas atividades. No seu cardápio, “Maria Isabel” (também conhecido como arroz de carreteiro), feijão tropeiro e carne assada. Para tirar a poeira da goela uma aguardente de engenho ou a legítima “Barra Grande” de Mato Grosso.

Com o curto tempo a peonada “filava a bóia” rapidamente. O cozinheiro lavava a tralha e seguia em frente. Tomava o rumo do ponto de pouso a fim de preparar a janta. O tipo de serviço deixava Pixiu um pouco isolado dos companheiros. Não admitia reclamações. O argumento era poderoso:

— “Na estrada não temos tempo de fazer mamadeirinha prá neném, sopinha de macarrão para filhinho querido. Lá em Barretos, a mamãe tem tempo”.

E o reclamante tinha que engolir a definição de “bóia”.

— “Aqui chama-se come calado… e do que tem!…”

Certa vez, um sujeito foi até a residência de Pixiu, na Vila Marília, somente para conferir se o cozinheiro havia esquecido o berrante num ponto de pouso. Provocado, a resposta foi imediata e firme:

— “Nunca aconteceu isso!”

Ainda irritado, desabafou:

— “Onde já se viu?!?…”

Porém, admitiu ter esquecido a trempe (fogão) “uma única vez…”

Segundo Pixiu, durou mais de 20 dias a viagem da comitiva de Sebastião Rodrigues que levou cerca de 1.200 cabeças até a fazenda na região do Anhembi, em São Paulo. A proprietária era conhecida como Dona Iaiá. Era 1946, início da carreira do cozinheiro. Tuca Preto fora o corretor da boiada. A volta, até Itirapina, acontecera a cavalo. De lá, até a terra de Chico Barreto, embarcaram no trem da antiga Companhia Paulista.

Assombração, lobisomem, mula-sem-cabeça, come-língua e “outros bichos” nunca foram vistos por Pixiu. Apesar de destemido e valente, era ressabiado com casa velha, preferindo arranchar no tempo, debaixo de uma árvore. Apesar de garantir que não tinha medo de nada, Pixiu recordou que em certa ocasião esteve numa fazenda de propriedade de Braz de Ávila, em Três Lagoas, MS. No interior da casa, ouvia um “zum zum”, semelhante ao barulho d’água de uma cachoeira. No entanto, no terreiro, não escutava nada.

Outro fato que considerava estranho acontecia na antiga chácara da Dona Henriqueta (hoje, bairro da cidade com o nome da ex-proprietária das terras). De acordo com Pixiu, à noite, mesmo com lua clara, tanto no galpão como no terreiro ou no meio do cerrado, os cachorros acuavam e não se via coisa alguma.

— “Acho que esses lugares eram assombrados”, afirmou.

No meio de tanta prosa, Pixiu, também metido a compositor, Pixiu convidou o cunhado Lazinho para um “show” particular.  E a dupla caipira apresentou um cururu que retrata a vida do cozinheiro:

“O meu nome é Laudelino

Natural fui batizado

Na cidade de Barretos

Fui nascido e fui criado.

O meu pai é sitiante

Mora meio arretirado

Foi um caboclo de gosto

E também muito estimado”.

E os versos se sucedem até o arremate:

“Fomos buscar uma boiada

Entre Franca e Batatais

Eram duas comitivas

E também dois capataz.

Agenor e Sebastião

Que prá contar eram os tais

Essa ficou na lembrança

Não esqueço nunca mais…”

Aquino José

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