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Do Tamanho de um Ideal: Silvestre, Olímpia e a Geografia da Política

 Do Tamanho de um Ideal: Silvestre, Olímpia e a Geografia da Política

A história territorial de Barretos é marcada por sucessivas alterações que, ao longo das décadas, redesenharam seus limites e desafiaram seus líderes. Cada mudança traz consigo não apenas números e leis, mas também personagens, paixões e disputas que revelam muito sobre o espírito da época.

Área territorial de Barretos em vermelho.

A primeira modificação ocorreu em 6 de setembro de 1892, por meio da Lei nº 87, que criou o distrito de paz de Bebedouro. Com isso, Barretos perdeu parte de seu território, que foi anexado ao município de Jaboticabal. Era o início de uma série de desmembramentos que, embora legais, nem sempre foram recebidos com tranquilidade.

O segundo episódio veio em 1900, com a separação da Fazenda da Onça, propriedade de Ezequiel Lemos de Toledo. A área foi incorporada ao município de Bebedouro. O episódio rendeu comentários espirituosos de Almeida Pinto em suas Chrônicas da Terra, que registrou com ironia:

“De vez em quando os vizinhos (aquele povo fino!) mexe lá os seus pauzinhos e aumentam o território. Na gana de desmembrar (que diabo de geringonça!) supondo filar-nos terras, nos livraram de uma onça! Se o Ezequiel me desse o terreno desmembrado, juro que não aceitava: Eu, de onça estou inteirado!”. (O Sertanejo, 13 de outubro de 1900, pág. 02)

A terceira divisão e a batalha de Silvestre de Lima por Barretos

Dentro da história de desmembramentos de terras, Silvestre protagonizou um dos momentos mais marcantes da história política local, motivada em razão da terceira e mais impactante alteração, ocorrida em 1917, com a criação do município de Olímpia. Barretos perdeu cerca de dois terços de sua área original. Uma redução drástica que não passou despercebida, especialmente por Silvestre de Lima, então presidente da Câmara Municipal.

Silvestre não se opunha à criação de um novo município, mas discordava veementemente da extensão territorial proposta. Para ele, a divisão era injusta e motivada por interesses políticos, especialmente os de seu adversário Antônio Olympio. A nova cidade nasceria com infraestrutura e benfeitorias realizadas por Barretos, mas a conta ficaria para quem ficou com menos terra.

Em um gesto de rara intensidade política, Silvestre buscou o governador do Estado de São Paulo e, em carta publicada no Estado de São Paulo em 15 de dezembro de 1917, expôs sua indignação e ofereceu um sacrifício pessoal em nome da cidade:

“De S. Excia. (o governador) solicitei e obtive em tempo, na minha qualidade de presidente da Câmara Municipal de Barretos, uma audiência especial, e dela sai sinceramente convencido de que nem tudo estava perdido para a causa que patrocinávamos. Expus a S. Exa. os termos da nossa questão; mostrei-lhe os documentos com que havíamos impugnado as divisas que no projeto de lei em discussão se traçavam para o novo município a menos de um terço da área total do seu território; fiz-lhe ver que podiam perfeitamente harmonizar os interesses em jogo, sem o sacrifício de nenhum deles; e conclui dizendo-lhe que só uma coisa parecia explicar a teimosia com que tais divisas eram pleiteadas: a paixão partidária. Mas acrescentei, para que nem esse mesmo pretexto pudesse prevalecer, que eu estava autorizado a declarar, por mim e por meus correligionários políticos, que nos prontificávamos desde logo a renunciar a todos os cargos públicos que ocupávamos em Barretos, por tal preço podíamos evitar a hedionda mutilação de que o município se achava ameaçado.” (O Estado de São Paulo, 15/Dez/1917, pág. 10)

Apesar da eloquência e da firmeza de Silvestre, Olímpia foi criada com a área pretendida. Comentava-se, com certo espanto e ironia, que a nova cidade nascera “maior e mais rica do que a própria mãe”. O Álbum Comemorativo ao 1º Centenário de Fundação de Barretos também aponta para a atuação de Antônio Olympio na defesa do desmembramento.

Com o tempo, Olímpia também passou por subdivisões, dando origem a Cajobi, Paulo de Faria, Guaraci, Severínia, Altair e Icém. Mas, como se fosse uma espécie de justiça poética, sua área atual é menor do que a de Barretos. A luta contra o desmembramento de Olímpia foi a última empreitada política de Silvestre de Lima. Frustrado com o resultado e decepcionado com os rumos da política, ele se retirou da vida pública e mudou-se para São Paulo, encerrando sua trajetória como defensor incansável do território barretense.

Outras alterações vieram depois:

  • Em 1925, pela Lei nº 2.096, foi criado o município de Colina, retirando mais uma porção de terras de Barretos.
  • No mesmo ano, o distrito de Jaborandi foi incorporado a Colina.
  • Por fim, em 1944, surgiu o município de Colômbia, completando o ciclo de desmembramentos.

Cada uma dessas mudanças redesenhou o mapa e, mais do que isso, redesenhou também os sentimentos de pertencimento e identidade dos moradores. Mas nenhuma delas teve o mesmo peso simbólico e político que a criação de Olímpia. Nenhuma dessas alterações encontrou um defensor tão apaixonado quanto Silvestre de Lima!

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