Morta pelo padrasto, jovem vira santa popular e é venerada no cemitério de Barretos

 Morta pelo padrasto, jovem vira santa popular e é venerada no cemitério de Barretos
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Um homem entrou na venda de José Neves, no Itambé, às 20 horas, daquele 10 de março de 1942. Tinha a roupa manchada de sangue.

— Cometi uma arte e quero me entregar…. – disse.

— Mas que arte você fez?

— Vá você mesmo ver, perto de um pequeno córrego próximo da vila, pouco acima do arrozal. Lá está o que fiz.

Eduardo Borsato, o subdelegado de Itambé, o farmacêutico Reinaldo Pereira e Pascola Beraldi foram ao local indicado. Chegando, viram muita gente cercando o corpo de uma jovem de 16 anos. Foi morta com um tiro e várias facadas. A faca ainda estava cravada do lado direito. A mãe da jovem, Josefa da Conceição, gritava:

— O assassino é o Antônio!….

Antes de matar a moça, Antônio Pires Cordeiro a encontrou a caminho junto com a sua irmã Isaura Santana, de 13 anos. A família havia se mudado para a vila e as jovens iam buscar as galinhas que já estavam no puleiro quando escureceu.

— Então você não quer casar comigo, está me tapeando há muito tempo, — disse ameaçador aquele lavrador, baiano de Juciabi, de 32 anos.

Não ouviu a resposta abafada da moça, dizendo “sim”. Ele a derrubou e lhe deu um tiro e as facadas.

Para escapar, a irmã da vítima refugiou-se num brejo, atolando no meio das taboas.


Tirada a algema, o sangue jorrou

O corpo de Maria Aparecida Conceição foi conduzido até a Cadeia de Itambé (atualmente Ibitu) – onde posteriormente foi furado um poço artesiano – sendo colocado numa mesa à espera da autoridade policial de Barretos.

— Na sala onde o corpo ficou, pingava sangue vivo, formando uma poça que nunca secou. Muita gente não acredita, mas mesmo passado algum tempo, quando lavavam o piso da Cadeia, saía sangue vivo…., contou Abília Neves Paixão, a Doca, entrevistada aos 65 anos. Ela lembrou que na época do crime tinha 17 anos e foi uma das pessoas que encontraram o cadáver.

O corpo foi trasladado para Barretos num caminhão. Na capela do cemitério municipal, ficou à espera do legista. Muitos curiosos se aglomeravam para ver o cadáver.

O então funcionário municipal Sebastião Ferreira da Silva lembrou que o sangue continuava a pingar do corpo da jovem, sem talhar. Segundo ele, quando o médico chegou, não quis retirar a faca que ainda estava cravada no cadáver, pedindo que o assassino fosse trazido para efetuar tal operação.

— Quando tiraram a algema de um dos pulsos do criminoso, o sangue jorrou do corpo da moça…., contou Sebastião Ferreira da Silva.

— Ele deu a volta em torno da pedra e, de cabeça baixa, puxou a faca. O sangue correu na lâmina. Então, o delegado mandou retirá-lo rapidamente do local…., contou.

O ex-funcionário municipal recordou que Maria Aparecida foi enterrada com vestido branco, num caixão também branco. Um fato impressionou profundamente Sebastião Ferreira da Silva:

— Quando peguei a morta para colocá-la no caixão, ela abriu os olhos e a boca. Parecia que queria dizer alguma coisa. Então eu disse: “pode falar”. Mas a moça não disse nada. Porém. Sua expressão me marcou para sempre.


O assassino foi para a Casa de Detenção

O baiano Antônio Pires Cordeiro estava amasiado com a mãe de Maria Aparecida e trabalhava para José Neves Paixão, cuja família lhe dedicava muita estima.

— Ele era muito trabalhador….., garantiu Doca.

Em outubro de 1942, o juiz Washington de Barros Monteiro determinou que o preso fosse conduzido sob escolta a Casa de Detenção de São Paulo.

Segundo Doca, na Casa de Detenção, Antônio Pires Cordeiro aprendeu e tornou-se um carpinteiro talentoso, gozando inclusive de certas regalias em virtude do bom comportamento. Seu ex-patrão sempre o visitava, insistindo para que ele retornasse a Barretos quando saísse da prisão. O detento sempre declinou o convite.

Ainda não se sabe o destino de Antônio Pires Cordeiro, bem como de Josefa da Conceição e sua filha Isaura Santana. Após o crime, a mãe e a irmã se mudaram de Itambé, não dando mais notícias.


A fama de santidade

O crime considerado “hediondo” pela imprensa da época chocou e comoveu a cidade. O povo começou a visitar o túmulo da jovem:

— Uma alma santa!

— Uma inocente!

— Uma virgem!

E começaram as orações, romarias, pedidos e promessas junto a tumba. Muita gente buscando lenitivo para seus padecimentos. A fama de santidade de Maria Aparecida começou a correr….

No Ibitu, outrora Itambé, populares construíram uma capelinha no lugar onde Maria Aparecida foi assassinada. A “igrejinha”, quase desconhecida, está localizada num canavial, próxima ao Córrego do Gaióla, na Fazenda Santa Luiza, de propriedade de Silvio Tomazini.


Detalhe do túmulo da santinha do Ibitu. (Foto: Aquino José)

Alguns moradores do Ibitu afirmaram que muita gente vai visitar o lugar onde o corpo da “santinha” foi encontrado.

— Quando o sol forte castiga a roça e o mantimento está perdendo, o povo faz caminhada de penitência pedindo a intercessão de Maria Aparecida. E a chuva vê…., contou certa ocasião a dona Luiza Lemos Gonçalves, uma moradora do distrito.

Maria Aparecida Conceição repousa na sepultura perpétua número 741, na quadra 1 Adulto. Defronte ao túmulo, foi construído um local apropriado para a queima de velas. Imagens, flores, terços, quadros, fotos, orações…. são deixados em sua tumba como lembranças de promessas. A busca de proteção, milagres e graças, atrai uma verdadeira romaria de devotos, principalmente às segundas-feiras da Quaresma e no Dia de Finados. 


Capelinha construída no local onde morreu a santinha do Ibitu. (Foto: Aquino José)

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Aquino José

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