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Um filme para sentir com o estômago: A imersão sombria de “Mad God”


Assisti Mad God com bastante expectativa — e desde o início, já deu pra perceber que esse não seria um filme fácil. A narrativa é fragmentada, quase inexistente, e em muitos momentos a história parece se perder no próprio simbolismo. Não é o tipo de obra que se preocupa em guiar o espectador com clareza, e sim em provocar, confundir e sufocar com imagens. Ainda assim, mesmo sem uma linha narrativa coesa, o filme consegue deixar uma impressão forte — talvez justamente por ser tão diferente.
O que realmente segura Mad God é a sua arte. Phil Tippett levou mais de 30 anos para concluir o projeto, e cada segundo de animação em stop motion é um trabalho de paciência e obsessão. A fluidez dos movimentos, a densidade dos cenários e o grau de detalhamento dos personagens são absurdos. Mesmo quem não se conecta com a proposta vai, no mínimo, se impressionar com a qualidade técnica. É o tipo de filme que exala dedicação, do tipo que só alguém completamente obcecado conseguiria terminar.
Visualmente, Mad God é como atravessar um delírio moldado à mão — um mundo em decomposição onde tudo pulsa entre o grotesco e o sublime. O cenário é povoado por corpos retorcidos, máquinas cruéis e estruturas que parecem estar sempre desabando. Enquanto escrevo, me vem à mente A Persistência da Memória, de Salvador Dalí: a mesma sensação de tempo liquefeito, de formas que se dobram e colapsam sob o peso de alguma lógica esquecida. É como se estivéssemos dentro de uma pintura que respira, sangra e sussurra. Sem diálogos para guiar, resta apenas a experiência sensorial — hipnótica, incômoda e estranhamente bela.
O protagonista, um viajante mascarado, atravessa esse mundo como quem caminha por círculos do inferno — e o filme funciona quase como uma descida simbólica ao caos, à decadência e talvez à mente do próprio criador. Phil Tippett, conhecido pelos efeitos de Jurassic Park e Star Wars, entrega aqui um manifesto visual. Não é um filme para entender, mas para sentir. E, nesse sentido, ele acerta em cheio. O trabalho é tão visceral que, em certos momentos, parece que o próprio diretor está se exorcizando pela imagem.
Mad God é, acima de tudo, uma experiência. Talvez não agrade quem busca uma história convencional, mas vai hipnotizar quem aceita mergulhar num universo onde a beleza e o horror andam lado a lado. É uma obra que exige fôlego — e paciência — mas recompensa com imagens que não saem da cabeça. Um filme para ver com o estômago, não com o cérebro. E pra lembrar que, às vezes, o caos também pode ser arte.
Ficha Técnica
Título Original: Mad God
Direção: Phil Tippett
Roteiro: Phil Tippett
Gênero: Animação, Terror, Experimental, Ficção Científica
Duração: 83 minutos
País de Origem: Estados Unidos
Ano de Lançamento: 2021
Classificação Indicativa: 18 anos
Produção: Tippett Studio
Técnica: Stop Motion
Onde Assistir:
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Assista o trailer abaixo:
